MARABÁ, SUDESTE DO PARÁ — A reportagem do Portal Debate teve acesso exclusivo ao inquérito da Polícia Federal (PF) que investiga fraudes ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a vestibulares de instituições do Grupo Afya, incluindo a Faculdade de Ciências Médicas do Pará (Facimpa), localizada em Marabá, sudeste do Pará. As investigações partiram de dados encontrados no celular apreendido do chefe do esquema criminoso, André Rodrigues Ataíde, de 23 anos, alvo das Operações Passe Livre I e II e atualmente em liberdade provisória.
Esquema de fraudes de vestibular de medicina da Facimpa/Afya vem sendo investigado a fundo pela Polícia Federal de Marabá
De acordo com a PF, as fraudes ocorreram durante vários anos, resultando em dezenas de alunos aprovados em vestibulares de medicina com notas obtidas de forma fraudulenta. O inquérito lista 21 suspeitos, incluindo seus nomes, fotos, nomes dos pais, números de celular e endereços. Todos estão matriculados na Facimpa ou em outras instituições do Grupo Afya. São eles:
1. Adriano Ferreira de Melo (de Tucuruí-PA)
2. Andrea Khrisman Santos (de Goiânia-GO)
3. Aylla Suriann Barbosa Galvao (de Marabá-PA)
4. Carlos Eduardo Rodrigues Campos (de Goiânia-GO)
5. David Gabriel Cardoso Rocha (de Goianésia do Pará)
6. Eduardo Machado Lins Vasco (de Maceió-AL)
7. Evellyn Lavygne Pinheiro de Sousa (de Altamira-PA)
8. Giovanna Bezerra de Moraes (de Imperatriz-MA)
9. Jeovanna Gabryella Reges da Silva (de Fortaleza-CE)
10. Jhonata Fernando Meier Rocha (de Goianésia do Pará)
11. Lucas Cunha Sa Maia Magon (de Marabá-PA)
12. Julia Leticia de Souza Barbosa (de Belém do Pará)
13. Marcelo Feitosa Batista Gomes (de Goiânia-GO)
14. Marcos Almeida (de Araguatins-GO)
15. Maria Luiza Sousa Carvalho (de Uruará-PA)
16. Matheus Caetano Carlot (de Marabá-PA)
17. Maria Gabriela Queiroz Coelho (de Balsas-MA)
18. Murillo Monteiro de Paula (de Marabá-PA)
19. Paula Vivian Sousa Lima (de Marabá-PA)
20. Richelmi Gomes Costa (de Marabá-PA)
21. Thais Maria Ferreira Simoes (de Marabá-PA)
O relatório da polícia descreve que André Ataíde atuava de forma sistemática e organizada, com a colaboração de pelo menos outras 18 pessoas, fraudando provas de vestibulares em troca de pagamentos em dinheiro. O foco principal de sua operação criminosa era a fraude de exames na modalidade on-line, aproveitando-se das vulnerabilidades dos sistemas de aplicação de provas remotas da Facimpa/Afya.
André cobrava R$ 2 mil por cada aprovação fraudulenta em vestibular de medicina, sendo que R$ 1 mil deveriam ser pagos antecipadamente a título de caução, como forma de evitar possíveis calotes dos candidatos. Caso o “cliente” não fosse aprovado no exame, André devolvia o valor integral, como chegou a acontecer em pelo menos dois casos.
Em um dos casos de falha da fraude, André orientou que a namorada do candidato não aprovado no vestibular transferisse o valor de R$ 1 mil (caução) diretamente para o namorado. Ela (Evellyn Lavygne Pinheiro de Sousa) havia sido aprovada na Facimpa e teria que transferir o valor restante do acordo para André, mas como o namorado dela não foi aprovado e teria de ter o dinheiro devolvido, André achou uma solução mais prática para quitar o débito.
A investigação conduzida pela PF revela que André não agia sozinho. Há indícios de cúmplices e suspeitas de conivência dentro da Facimpa em Marabá. Segundo a PF, outras 18 pessoas colaboraram com André para fraudar provas na Facimpa/Afya, e esse número pode aumentar, sugerindo que a fraude pode ter sido facilitada por indivíduos com acesso privilegiado aos processos de aplicação das provas on-line.
Veja lista de cúmplices de André Ataíde:
Adrielli Karpinski Pedroso
Alanna Isabella Alves Almeida
Ana Clara Castro de Barros
Beatriz Vasconcelos Torres
Camilla Rayane de Brito Lordão
Carlos Eduardo Alexandre Silva
Clarissa Petri Fernandes
Elton Arruda Costa
Erivelton Silva Pinto Junior
Gustavo Souza Araújo
Hiago Silva Rattes
João Felipe de Bessa Albino
João Lucas de Aguiar Sampaio
José Luiz Farias de Oliveira
Luiz Carlos Rodrigues Furtado
Maria Antônia de Melo e Carvalho Ramos
Rafaella Resende de Almeida
Thinan Anthony Leão Walfredo
“A prova é feita com webcam e microfone ligados, a fim de monitorar o comportamento dos candidatos para evitar fraudes. Para burlar esse sistema ANDRÉ utiliza a seguinte técnica: o candidato precisa de uma pessoa que o auxilie, sentando-se ao lado e posicionando um celular próximo ao notebook em uma posição que não fique aparente na webcam, conforme demonstrado por ANDRÉ em alguns vídeos enviados aos candidatos”, descreve trecho do inquérito da PF, contendo 18 páginas.
A reportagem do Portal Debate tomou conhecimento que André Ataíde está inscrito para realizar a prova da Facimpa, que ocorrerá na modalidade on-line neste domingo (26), após ter sua inscrição aceita pela instituição com a nota do Enem no último dia 15 de maio.
O que diz a Afya/Facimpa
Procurada pela Redação do Portal Debate, o Grupo Afya emitiu nota oficial, por meio da qual afirma que as provas na modalidade on-line são aplicadas mediante “um dos mais modernos e reconhecidos sistemas de segurança da atualidade, equivalente ao sistema da prova norte-americana Toefl”.
Ainda segundo a Afya, as provas são “acompanhadas por monitores e fiscais que, conectados ao sistema, podem solicitar imagens mais detalhadas de eventuais ocorrências suspeitas e desclassificar o concorrente imediatamente”.
Com relação às providências que serão adotadas quanto aos estudantes aprovados devido às fraudes ao sistema, como demonstrado pela Polícia Federal, a Afya declara que não compactua com “quaisquer comportamentos que estejam em desacordo com os mais altos preceitos legais e éticos que a regem” e que “havendo comprovação de não conformidade, aplicará as medidas adequadas”.
Leia a nota na íntegra:
“A Afya esclarece que possui duas formas de processos seletivos para seus cursos de graduação.
Os alunos que ingressam via Enem utilizam suas notas obtidas em prova aplicada pelo governo federal. Para as investigações em curso sobre esse tema, a instituição segue à disposição das autoridades competentes, comprometendo-se a fornecer todas as informações que venham a ser solicitadas e, sempre que necessário, tomará as medidas cabíveis dentro do que prevê a legislação.
Para o caso do vestibular próprio, a instituição aplica uma prova on-line através de um dos mais modernos e reconhecidos sistemas de segurança da atualidade, equivalente ao sistema da prova norte-americana Toefl. O sistema foi desenvolvido para monitorar os candidatos e garantir total integridade do processo. Utilizando inteligência artificial, a plataforma grava o candidato em tempo real e o monitora por áudio e vídeo durante toda a execução da prova, realizando o bloqueio ou a quebra de conexão do concorrente em caso de suspeita de fraude, como tentativa de abertura de outra tela no computador, uso de celular ou ausência do candidato à frente da máquina.
A realização das provas também é acompanhada por monitores e fiscais que, conectados ao sistema, podem solicitar imagens mais detalhadas de eventuais ocorrências suspeitas e desclassificar o concorrente imediatamente.
A instituição reforça que atua com transparência, não tolerando quaisquer comportamentos que estejam em desacordo com os mais altos preceitos legais e éticos que a regem. A Afya afirma seu compromisso com a integridade e a justiça em todas as suas atividades acadêmicas e que, havendo comprovação de não conformidade, aplicará as medidas adequadas.” (Portal Debate)